((( Eu nasci de um sopro e o que me conduziu foram as correntes. )))
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Fuga ao secreto
Conto toda uma gama de mentiras só pra fugir por alguns ligeiros instantes de tudo aquilo: família, faculdade, trabalho, banco, paixões incontroláveis; cidade grande.
Meu coração entra em um compasso tão frenético que a sensação que toma meu corpo é que a qualquer momento eu poderei vomitá-lo. Sinto o fervor de tantas pessoas, o frio de cada individualidade endurecida contrastado com o encanto da imaginação nos olhos das crianças, que deslumbram-se e ao mesmo tempo se decepcionam com tudo.
É duro enxergar à toda hora o intrínseco sentido de todas as burocracias sociais, tão árduo que prefiro redirecionar os ventos desta prosa.
Se fujo é para que ninguém me encontre. Vou à minha praia secreta, poucos conhecem-na. Não quero me exceder na caracterização desta praia porque temo que muitos outros venham a descobrí-la, e, portanto, tudo que digo é que ela é pequena e tem ilhas quase mágicas, distantes, entre a linha do horizonte e a praia. A praia é tão pequenina que nos mares bravos e certas marés sua areia todinha se esvai restando apenas pedras sobre pedras. Acho bonito como rapidamente nascem algas nestas pedras que a tão pouco tempo estavam debaixo da areia.
Aqui, finalmente, o barulho do esfarelar constante das ondas nestas pedras faz neutralizar a ressonância do som dos veículos nervosos. Aqui, finalmente, retomo a tranquilidade de meus campos sensoriais e consigo admirar alguma beleza na existência, é quase instantâneo. Aqui tenho atmosfera pra ler aquilo que não consigo se estou preso em um cubículo.
Finalmente o corpo se encaixa vagarosamente e vai parando de vibrar nervosamente num ritmo trêmulo que me lembra o pânico inconsciente.
Acho que a alma carioca está sempre em contato com esse 'pânico'. Seja diante do caos que a impera ou seja diante de tamanha e inefável beleza que nos prende no ato de observar, furiosamente encantados, e talvez por isso tão entusiasmados a vivermos intensamente.
Uirah Felipe Grano Gaspar